Após a ascensão do novo regime sírio, este adotou uma postura linha-dura em relação à Rússia, lançando dúvidas sobre o futuro da presença russa no país. Como parte desses acontecimentos, a Rússia reduziu significativamente sua presença militar na Síria, realocando tropas e transferindo armamento, navios, aeronaves e equipamentos substanciais para outras bases na região. Notavelmente, a Rússia expandiu e reforçou suas instalações militares na Líbia, sinalizando uma potencial retirada completa da Síria. Em meio ao reaquecimento das relações com a Líbia, a Rússia tem contado com a base aérea de Al-Khadim, perto de Benghazi, para reforçar sua presença militar na região do Sahel, na África.
No entanto, no início de 2025, começaram a surgir sinais de mudança. Diversos relatos indicavam que a Rússia e a Síria estavam negociando a manutenção da presença militar russa na Síria. No entanto, até junho de 2025, nenhum progresso havia sido feito e, oficialmente, as forças russas permaneciam concentradas nas bases de Hmeimim e Tartus.
Relatos recentes da Síria sugerem que a Rússia está explorando soluções alternativas para sustentar sua presença, soluções que, no momento, são independentes do novo regime. Com base nesses relatos, parece que a Rússia está tentando garantir uma posição no Aeroporto de Qamishli, no norte da Síria. Localizado próximo à fronteira turca, em uma área controlada pelos curdos, o aeroporto de Qamishli é um território familiar para a Rússia. Desde 2016, as forças russas mantêm presença no local, operando uma base que hospedou helicópteros de ataque Mi-8 e Mi-35 para patrulhas conjuntas com a Türkiye. A base aérea também acomodou aviões de carga, veículos blindados, tanques, sistemas de vigilância e até mesmo um hospital de campanha, protegido pela polícia militar russa.
Desde março de 2025, a Rússia começou a realocar tropas, equipamentos e sistemas para Qamishli por meio de voos cargueiros de Hmeimim. Essas transferências se intensificaram entre abril e junho de 2025, com a base passando por melhorias de infraestrutura e melhorias significativas em suas capacidades de segurança e defesa. Atualmente, a base abriga principalmente helicópteros de combate. Notavelmente, a redistribuição da Rússia para Qamishli coincide com a retirada das bases americanas da Síria. A questão central é se a Rússia conseguirá manter suas bases militares e influência política na Síria pós-Assad. O que está claro é que a presença russa em locais estratégicos como a Base Aérea de Hmeimim e o Porto de Tartus, na costa, bem como o Aeroporto de Qamishli, no nordeste da Síria, permanece intacta. Essas bases funcionam como enclaves de segurança fora do fraco controle do novo governo, criando atritos entre os atores de segurança e servindo como potenciais focos de conflito sectário. Apesar de anos de apoio ao governo Assad, Moscou foi uma das primeiras a se envolver com milícias sírias após sua queda, um movimento pragmático que reflete os interesses da Rússia. O Kremlin tem interesse em manter Hmeimim e Tartus, visto que são cruciais para a logística da Rússia no Oriente Médio e na África. Além disso, a presença da Rússia na Síria é de grande importância para o país; Em um contexto mais amplo, serve como alavanca em potenciais negociações com os EUA e como alavanca nas relações com a Turquia e Israel, ao mesmo tempo em que reforça sua autoridade no Oriente Médio.
Reações Internacionais à Presença Contínua da Rússia na Síria
Embora o Ocidente e alguns países árabes do Oriente Médio tenham saudado a queda de Assad e a formação de um governo de transição, a presença militar contínua da Rússia continua sendo uma preocupação para várias nações ocidentais. À medida que os EUA, a UE e o Reino Unido se voltam para o apoio à Síria pós-Assad, seus objetivos incluem estabilizar o país, preparar o retorno de refugiados e combater a influência iraniana e russa, que consideram barreiras para uma transição bem-sucedida. Assim, da perspectiva deles, as bases russas em Hmeimim, Tartus e Qamishli são vistas como ameaças imediatas e de longo prazo à estabilidade da Síria. A maioria dos membros da UE e o Reino Unido consideram a presença militar russa desestabilizadora, especialmente devido ao seu papel no apoio e posterior destituição de Assad, o que aprofundou a desconfiança nas promessas de Moscou em relação à soberania síria. Relatos sugerem que Israel pressionou Washington a tolerar bases russas como um "contrapeso" à Turquia e a manter a Síria fraca e não ameaçadora. Apesar da escalada dos ataques israelenses contra alvos iranianos após Assad, Israel manteve canais de comunicação com Moscou, vendo a Rússia como uma salvaguarda contra surpresas estratégicas, como a expansão turca ou colapsos de segurança que favoreçam o Irã ou os takfiris. Em meio à guerra na Ucrânia, a UE e o Reino Unido percebem, em grande parte, a influência contínua da Rússia no Mediterrâneo como uma ameaça à segurança europeia, especialmente devido ao reduzido envolvimento dos EUA e à mudança na dinâmica internacional. Consequentemente, os europeus rapidamente se mobilizaram para apoiar Damasco, suspendendo as sanções. Os europeus buscam preencher o vazio por meio do apoio econômico e político à Síria, para conter a influência de Moscou. Seu objetivo é impedir o retorno da Síria à órbita da Rússia, mitigar os fluxos de refugiados e incentivar o retorno para aliviar as pressões migratórias internas.
Bases Russas como Alavanca em Disputas por Poder
Alguns argumentam que a presença da Rússia, apesar dos desafios, poderia servir como uma ferramenta de barganha para o governo de transição da Síria e as principais potências internacionais que disputam influência na Síria ou na região. Damasco, ciente da necessidade de Moscou de manter uma posição no Mediterrâneo Oriental, onde suas bases sírias são vitais para a influência regional e as operações africanas, detém uma carta vencedora única. Assim, o governo de transição sírio, ao legitimar condicionalmente o uso temporário dessas bases pela Rússia, busca concessões. Damasco iniciou novas negociações e solicitou revisões nos contratos de arrendamento concedidos à Rússia por Assad, que considera unilaterais, para que possa se beneficiar financeira e politicamente, incluindo o alívio da dívida e a liberação de fundos congelados como condições para a Rússia manter suas bases. Damasco chegou a vincular a questão ao destino de Assad, exigindo sua extradição em troca de acesso às bases — uma medida ousada, embora a Rússia tenha se recusado até o momento. O Kremlin sabe que, se as bases forem consideradas ilegítimas, a Síria poderá recorrer à comunidade internacional, potencialmente isolando Moscou. Por enquanto, a Rússia busca negociações discretas, oferecendo gestos simbólicos como a proposta do presidente Putin de converter Hmeimim em um centro de assistência, evitando compromissos firmes; a Rússia demonstrou sua disposição para retomar as negociações. Em última análise, o governo de transição e seus apoiadores veem a influência russa como um obstáculo à plena soberania da Síria, mas é improvável que Moscou recue facilmente.
Perspectivas
A Rússia parece determinada a usar sua presença na Síria para objetivos geoestratégicos. A revitalização da Base Aérea de Qamishli, em meio às negociações americanas para uma potencial retirada a leste do Eufrates, representa uma oportunidade para expandir a influência russa — embora com ferramentas de soft power. O apoio calculado de Israel às bases russas reflete um cenário de segurança fragmentado, que pode prejudicar a estabilidade ou criar novas dinâmicas para as potências regionais.
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