A visita à Colômbia de um correspondente da revista americana Time, em colaboração jornalística com o Amazon Underworld (um projeto transfronteiriço que oferece uma visão global do ecossistema criminoso na Amazônia, explicou a Fundação Gabo), forneceu um testemunho em primeira mão sobre os desafios atuais em torno do tráfico de drogas, conflitos armados e negociações de paz nas regiões fronteiriças do sul do país. No artigo intitulado "O Fim do Conflito da Cocaína na Colômbia Depende da Negociação com Guerrilhas do 'Século XXI'", o correspondente acompanhou Jairo Marín, também conhecido como Popeye, enquanto ele atravessava o Rio San Miguel — a fronteira natural entre a Colômbia e o Equador — de lancha rápida para se encontrar com uma de suas unidades armadas.
Marín, um homem de cerca de 50 anos, é o atual negociador-chefe dos Comandos de Fronteira, uma organização armada que ele define como um "grupo guerrilheiro do século XXI" que controla extensas plantações de coca na região amazônica. Segundo a reportagem, os Comandos de Fronteira desempenharam um papel de liderança nas negociações promovidas pelo governo do presidente Gustavo Petro, que buscam acordos com grupos armados considerados essenciais para o avanço das negociações de paz e dos esforços para conter o narcotráfico. "O Estado, com suas forças militares e policiais, não pode fazer muitas coisas. Nós podemos", afirmou Marín em entrevista à revista americana. A pressão é extrema. Com menos de um ano para o fim de seu mandato, Petro enfrenta a urgência de chegar a um acordo sobre resultados concretos. Isso é precedido por números recordes de cultivo de coca em 2023, ultrapassando 625.000 acres. Por todos esses motivos, o governo dos Estados Unidos continuou ameaçando cortar a ajuda militar por falhas no combate às drogas.
Durante a visita, Marín explicou que seu grupo, equipado com uniformes e armas de assalto, é composto por aproximadamente 1.200 combatentes. O grupo inclui ex-membros das FARC, ex-soldados, paramilitares e novos recrutas, muitos deles de comunidades indígenas. "Controlamos muitas coisas", insistiu Marín na entrevista. Ao norte do rio, a região é coberta por extensas plantações de coca; ao sul, é o território protegido dos Cofán (um povo indígena) no Equador.
Esta é a realidade na fronteira entre a Colômbia e o Equador: qual é o ideal para o combate dos Comandos da Fronteira?
O veículo de comunicação americano testemunhou em campo como a guerra interna na Colômbia deixou de ter um caráter estritamente ideológico. O correspondente Bram Ebus explicou que a violência agora decorre principalmente dos interesses de economias ilegais, geridas por sofisticadas redes transnacionais que operam como "Estados paralelos", regulando a circulação de pessoas, administrando a justiça e controlando a população com violência e ameaças. Em Putumayo, onde se estima haver 123.000 acres de plantações de coca, os Comandos e outras organizações cruzam facilmente o Equador e o Peru para escapar das operações das forças armadas. A cocaína dessa região parte para portos do Pacífico e é transportada por rios até o Brasil, servindo tanto como destino final quanto como ponto de trânsito para a África e a Europa. Além disso, após o acordo de paz de 2016 entre o governo e as FARC, consta que a desmobilização deixou um vácuo de poder. Mais de 500 ex-combatentes das FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) foram mortos após deporem as armas, o que levou Marín e sua comitiva a se reagruparem. "Vamos nos unir, nos armar novamente, porque não podemos deixar que nos matem. Foi assim que a organização começou", disse "Popéye", explicando como dezesseis pessoas fundaram o grupo em 2017, formalizando-o como Comandos da Fronteira em 2020. O resultado desse novo domínio teve repercussões para as comunidades locais. Por esse motivo, autoridades comunitárias, sob condição de anonimato, descreveram ao mesmo veículo como os Comandos da Fronteira recrutam menores, realizam assassinatos seletivos e mantêm o controle por meio de pressão direta sobre os conselhos locais. "O inimigo já estava em nossa casa e não percebemos", disse um líder indígena à publicação. Os líderes do grupo armado, que se autodenominam "regionalistas", formularam uma plataforma chamada "transformações territoriais", com a qual afirmam estar dispostos a abandonar a economia ilegal da coca e a atividade armada, sob a condição de que o Estado garanta segurança e oportunidades legais para as pessoas população. “Estamos abertos a mudanças se o Estado cumprir”, afirmam em sua agenda de negociações. O correspondente também conversou com Armando Novoa, representante do Estado na mesa de diálogo, e ele afirmou: “Nos diálogos com os Comandos, concordamos com a necessidade de superar a hegemonia das economias ilegais ligadas à coca e à mineração ilegal nessas áreas”. Além disso, Novoa explicou o objetivo da transição da economia ilícita para as atividades legais, insistindo que “segurança e diálogo devem andar de mãos dadas. A presença do Estado não pode depender apenas da repressão armada”. A posição dos cocaleiros no Putumayo: “Traz violência, morte e muitos problemas”. Os cocaleiros da região disseram ao correspondente que muitos deles aspiram a substituir a coca por cultivos alimentares, mas precisam de títulos de propriedade, crédito e acesso ao mercado. “A coca traz violência, morte e muitos problemas. É por isso que queremos transformar as coisas”, disse um produtor do Putumayo. No entanto, tentativas anteriores fracassaram devido à falta de financiamento, obstáculos burocráticos e falhas nos componentes técnicos dos projetos de substituição. Gloria Miranda, diretora nacional do Programa de Substituição de Cultivos Ilícitos da Colômbia, comentou que a coordenação atual entre a política antidrogas e a paz abrangente é essencial para alcançar resultados sustentáveis. "O Estado deve retomar o controle por meio de políticas sociais e meios não violentos. O poder militar é apenas uma dimensão", explicou Miranda na entrevista. O Papel do Estado e os Resultados dos Diálogos com os Comandos de Fronteira. Além disso, o funcionário do governo Petro especificou que os Comandos de Fronteira permitiram a implementação de programas de substituição de cultivos, algo que não ocorreu com grupos armados anteriores. "Vemos positivamente que o grupo não se opõe e, na verdade, quer que o programa avance sem confrontos ou ameaças", afirmou o funcionário. O processo — como destacado na análise apresentada no artigo — deve produzir resultados rápidos, visto que o governo Petro está enfrentando a reta final de seu mandato e a instabilidade política pode comprometer os compromissos assumidos. Marín, por sua vez, afirmou sua disposição de continuar as negociações mesmo com uma possível mudança de governo: "Se não chegarmos a acordos concretos ou parciais, iremos até onde nos permitirem". Por fim, a visita foi concluída com a posição de Marín, que, a poucos metros da fronteira com o Equador, resumiu a relação de sua organização com o Estado. "Nossa política desde a fundação é não atacar o Estado, mas se nos atacarem, nos defenderemos", concluiu o "Popéye".
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